Há suspeita de influência do esquema do doleiro Alberto Yousseff nos investimentos de Petros e Postalis
RIO – A Operação Lava-Jato, da Polícia Federal, que revelou a relação entre o ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa e o doleiro Alberto Youssef, começa a esbarrar em possíveis ramificações nos fundos de pensão de funcionários das estatais. Controladas por dirigentes indicados por partidos da base do governo, essas entidades acumulam prejuízos em operações financeiras complexas e parecem obedecer a uma coordenação externa para fazer os mesmos investimentos controversos.
A PF abriu uma nova frente de investigação para apurar se investimentos feitos por fundos de pensão em empresas ligadas a Youssef foram influenciados pelo tesoureiro do PT, João Vaccari Neto. O GLOBO revelou que o advogado Carlos Alberto Pereira Costa, um dos principais auxiliares de Youssef, disse em depoimento que Vaccari frequentou uma empresa em São Paulo, entre 2005 e 2006, para tratar de negócios com fundos de pensão com um operador do doleiro.
Domingo, o jornal “Folha de S.Paulo” revelou que a PF encontrou e-mails em computadores de pessoas ligadas a Yousseff atribuindo à influência de Vaccari a aplicação, em 2012, de R$ 73 milhões das fundações Petros e Postalis, dos funcionários da Petrobras e dos Correios, na empresa Trendbank, que administra fundos de investimentos, causando prejuízos às fundações. Vaccari nega participação. Em maio, O GLOBO já havia mostrado que Postalis teve prejuízo ao aplicar R$ 40 milhões num fundo no Banco BNY Mellon por meio de uma gestora de investimentos indicada a dirigentes da fundação por operadores de Youssef, em 2012.
A complexidade e o grande número de operações, muitas delas feitas de forma indireta por meio de fundos que fazem outros investimentos, dificultam a identificação dos prejuízos dessas fundações, que administram as contribuições de funcionários das estatais e pagam os benefícios complementares aos aposentados dessas empresas. Os negócios suspeitos já revelados mostram que os interessados em lesar os fundos usam como estratégia a capilaridade e a divisão dos riscos entre vários fundos.
Um caso emblemático é a quebra do Banco BVA, em 2013, cuja falência foi formalmente pedida no início deste mês. Apuração do Banco Central apontou indícios de conluio entre dirigentes do BVA e da Petros na formulação de operações fraudulentas. No entanto, mais de 70 fundos de pensão de funcionários de estatais, estados e prefeituras perderam dinheiro no BVA comprando principalmente títulos lastreados em empréstimos dados pelo BVA a empresas com poucas condições de pagamento. Compraram juntos R$ 2,7 bilhões diretamente ou por fundos de investimento ligados ao BVA.
PREJUÍZOS COM DEBÊNTURES DO GALILEO
Nesse tipo de papel, se o credor não paga numa ponta, o investidor (no caso o fundo de pensão) perde na outra. Petros e Postalis estão entre os que mais perderam dinheiro no BVA. Os dois fundos são protagonistas de outro fracasso: compraram R$ 100 milhões em debêntures do Grupo Galileo, mantenedor da Universidade Gama Filho, que fechou as portas insolvente no ano passado. A Petros comprou 25% dos papéis e o Postalis ficou com os outros 75%, contra a regulação que limita aos fundos a aquisição de até 25% de emissões de títulos.
Postalis e Petros têm muito mais em comum do que péssimas aplicações. O atual presidente do Postalis, Antonio Carlos Conquista, foi executivo da Petros entre 2003 e 2009, quando o fundo de pensão era dirigido por Wagner Pinheiro, atual presidente dos Correios, que o indicou para o Postalis. O fundo de pensão dos Correios é dividido entre o PT, que indicou o presidente, e o PMDB, que indicou os outros diretores, inclusive o financeiro. A Petros segue sob domínio exclusivo do PT, embora as diretorias sejam divididas por dois grupos: o dos ex-sindicalistas bancários e o dos petroleiros, todos oriundos da CUT, braço sindical do PT.
NO POSTALIS, ROMBOM DE R$ 1 BILHÃO
Com um patrimônio de R$ 6,8 bilhões, bem menor que o da Petros (R$ 60 bilhões), o Postalis tem sofrido mais com a má gestão. Os prejudicados são os 140 mil participantes, o maior contingente entre as fundações de estatais. Em 2012, o Postalis passou a cobrar contribuição adicional dos participantes e pensionistas para cobrir um rombo de R$ 1 bilhão, cuja metade foi assumida pelos Correios. Agora, segundo funcionários, novo déficit atuarial chega a R$ 2,2 bilhões.
A Previc, órgão do Ministério da Previdência que fiscaliza as fundações, é considerada lenta nas investigações, que não são transparentes e geralmente terminam em punição leve. Em agosto, a Associação dos Profissionais dos Correios (Adcap) e outras entidades pediram à Previc uma intervenção no Postalis. — A diretoria da Previc nos informou que a reposta só virá no fim de outubro ou em novembro — afirmou Maria Inês Capelli, presidente da Adcap.
A Previc se recusou a informar que medidas toma sobre o Postalis, alegando, em nota, que “não trata publicamente de situações específicas, em face da necessária preservação de fatos e dados envolvidos em possíveis processos administrativos.”
Em nota, o Postalis informou que reestruturou sua carteira de investimentos da fundação, privilegiando títulos públicos, e negou influência de Youssef. A fundação considera natural que vários fundos de pensão participem de um mesmo investimento, já que são grandes investidores no mercado. O mesmo argumento foi usado pela Petros, que também negou influência política e disse que as avaliações de investimento são estritamente técnicas. A Petros diz não ter investido diretamente no BVA e diz ter recuperado 90% do que investiu em operações estruturadas pelo banco, mas não informou o valor.
(Fonte: O Globo, por Alexandre Rodrigues e Rennan Setti, 01/10/2014)