Itaboraí e Macaé sofrem com perdas no setor de petróleo

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Cidades vivem clima de apreensão com retração no comércio e na hotelaria

Outrora vivendo um momento de bonança com o anúncio de investimentos bilionários na construção do Complexo Petroquímico da Petrobras, Itaboraí vive uma fase de apreensão, desemprego e frustração. Com o atraso nas obras do Comperj, projetos já concluídos estão longe de obter o lucro previsto. São prédios comerciais, hotéis, shoppings e outros empreendimentos erguidos para atender a demanda prevista com o polo da estatal. A população local teme que a situação traga, no lugar do vigor econômico, desemprego, favelização e violência.

No Norte Fluminense, Macaé enfrenta dias de apreensão. A economia da cidade vive majoritariamente do petróleo e já mostra reflexos da crise da Petrobras em diversos setores, diz o prefeito Aluízio dos Santos Júnior:

– Quase 100% da economia de Macaé vêm do petróleo. Dos empregos formais, 63% estão ligados ao setor. A indústria parou, as empresas estão demitindo, as vendas do comércio caíram.

Ele destaca que Macaé encerra o ano com resultado negativo no mercado de trabalho do petróleo, com 4.600 demissões, ante 4.330 contratações:

– No petróleo, concorremos com o mercado internacional. E as grandes multinacionais estão ansiosas com a situação, tendo perdas. A situação da Petrobras, com o problema no cenário mundial, pode afugentar empresas e investimentos.

Em Itaboraí, a temida carta de demissão já é uma realidade nas mãos de trabalhadores de empresas terceirizadas pela Petrobras e que realizam parte das obras do Comperj, que chegou a ser vendido como um dos maiores complexos petroquímicos do mundo, com investimentos previstos de US$ 13,5 bilhões, ou cerca de R$ 35 bilhões com o dólar na casa dos R$ 2,60.

– Somos um eldorado sem ouro – sintetiza Mário Ribeiro, gestor predial em Itaboraí.

No setor hoteleiro, a crise é visível. O hotel Ibis Itaboraí, da rede Accor, completará dois anos em maio de 2015.

A ocupação média de 2014 não deve passar de 42%, muito aquém da meta de 75%.

– Temos 180 quartos, mas apenas 54 são ocupados por dia, em média. O grande “x” da questão é o polo petroquímico. Até agora não atraiu investimentos e negócios como esperávamos. E tememos pelos cortes de investimento em 2015, ainda mais que outros três hotéis devem abrir na cidade – informou Ary Comar, gerente do empreendimento.

Imóveis encalhados

O aproveitamento de hotéis de Itaboraí e Macaé caiu perto de 15% ao longo do ano. Até na capital fluminense houve retração, diz Alfredo Lopes, presidente da Associação Brasileira da Indústria de Hotéis do Rio (ABIH-RJ):

– A retração é a ponta do iceberg. Nos hotéis do Centro do Rio, as reservas feitas pela Petrobras caíram mais de 30%. Em 2015, as taxas devem piorar. O Rio pode ser poupado por contar com obras públicas, preparativos para a Rio 2016 e eventos. Mas, de modo geral, haverá perda.

A corretora de imóveis Valdinéia Dias da Silva, há 23 anos no mercado de Itaboraí, afirma que os preços estão caindo na cidade. Após uma bolha com o anúncio do Comperj, quando um imóvel de R$ 100 mil foi vendido por R$ 1 milhão, os preços caíram, e casas dessa categoria agora são comercializadas por R$ 400 mil.

– Muita gente está com imóvel encalhado, mas não dá para dizer que está tudo parado. Quem baixa os preços vende. Mas sabemos de problemas. Alguns alojamentos (de trabalhadores) nunca lotaram, estão operando com 40% de ocupação e o preço da cama está em R$ 20 a diária. Um quarto com quatro camas já sai por R$ 60 – disse.

E a ocupação deve diminuir. No Alojamento Apoio, o clima era de apreensão: a todo momento, chegavam peões com a carta de demissão na mão. Edilson Justino Martins, o Canela, demitido na terça-feira pela Toshiba, acha que a situação está piorando por causa das denúncias de corrupção.

– Trabalhei três anos como montador em Abreu e Lima (PE) e a gente ganhava muito mais lá, R$ 2.700 mais o “Fome Zero” (tíquete alimentação) de R$ 700. Aqui, o salário estava em R$ 2.400 e agora deve baixar mais, pois a empresa precisa entregar a obra em maio, mas certamente vai terceirizar – disse.

O pernambucano Alex Jardim Rodrigues tentava se consolar:

– Pelo menos, volto mais cedo para passar o Natal em casa. Sem dinheiro, mas em casa.

As demissões e o medo de novas dispensas já afetam o Natal da cidade. Na loja popular Objetiva, que vende roupas no centro de Itaboraí, as vendas de dezembro estão 50% inferiores às do mesmo mês do ano passado.

– O fim de ano está bem diferente dos anteriores. Não é algo da nossa loja, é geral, em toda a cidade. Se a situação piorar teremos que demitir funcionários, mas, graças a Deus, ainda não precisamos fazer isso – disse o gerente Paulo Roberto Ribeiro.

Rosy Gomes, nascida em Itaboraí, conta que o clima de medo domina a cidade. Com 46 anos, ela viu nos últimos meses 15 funcionários da empresa onde trabalha, uma firma de alimentação para operários, serem demitidos. Agora, há boato de que novas dispensas vão ocorrer entre os 50 trabalhadores que restaram:

– A gente está com medo de a crise voltar. E ainda temos o medo do que esse povo todo vai fazer aqui em Itaboraí. A cidade cresceu muito nos últimos anos, começamos a ter mais problemas de trânsito, de violência.

O Shopping Itaboraí Plaza, em construção às margens da BR-101, mantém o clima de otimismo. O primeiro shopping da cidade está quase pronto, mas atrasado. Com 170 lojas, cinema, dois prédios comerciais e um hotel, deve ser inaugurado no fim de fevereiro. Segundo Sandra Lima, gerente de Marketing e Comercial do shopping, o projeto não depende do Comperj:

– Há demanda na região e não há ofertas de produtos e serviços. O shopping mais próximo fica em São Gonçalo.

(Fonte: O Globo, por Henrique Gomes Batista, Enviado Especial/Glauce Cavalca,  21/12/2014)